POEMAS


I don’t care, You don’t quer


Que vontade de escrever
“I don’t care” na minha cara
(Mas sei que You don’t quer)
pois estou de saco cheio
dessa luta partidária.

Não é fazendo apologia
a negar o que há então
que se usa bem a voz,
que explore o Q da questão.
O que há por trás é relevante,
mas seu modo delirante
- de “pára tudo!” todo instante -
só nos traz mais opressão.

Não é por ser esquerdista,
direitista, bipolar
que me vejo no direito/
obrigação de aceitar.
Não que eu seja “alienada”
“tá por fora”, “sabe nada”
e nem mesmo acomodada...
É meu jeito de lutar.

Mas só me deixe escrever
“I don’t care” na tua cara
(ta ok, You don’t quer)
Isso sim é que lutar
É assim que o mundo pára!

Não, não venha condenar
Aquele que não “se atreve”,
Pois não é parando tudo
Que se faz a boa greve.
E vou dizer, aliás
Penso que é fácil demais
Sair andando pra trás
Pensando que história escreve.

Seu discurso grita a rua
Grita o pátio, grita a sala
Mas não convence, eu já disse
Pois sei que é fogo de palha.
Sua ofensa reprimida
Nessa folha imprimida
Faz ficar deprimida
Toda árvore que valha.

Então me deixe gritar
“I don’t care” pra aquele cara.
(Mas sei que You don’t quer)
o convencer que essa luta
É uma coisa secundária.
Direito do negro, do homem,
Do professor, da mulher.
Tudo isso faz sentido
Se se sabe o que se quer.
Mas ficar só atacando
o outro partido, brigando
(minha aula atrapalhando)
É só que I really don’t care!

E se a moda agora é
flor na rua e pé no chão,
você fica nessa tua
e não me tire a razão:
justamente do contrário,
meu amigo greviário,
farei o etinerário
da minha revolução.
(2010)

Jornada diurna


Há dias que até o chão se enruga para que eu caia e
todos os semáforos se fecham na hora da travessia.
Há dias assim que o rádio da memória só toca lembranças ruins
e todas as ambulâncias carregam alguém que alguém ama.
E diante disto só resta a contemplação, a remela.

A moça sentada fala da patroa malvada
O velho de pé fala sobre a malvada política.
Dizem que falar impede que os problemas nos enlouqueçam
Mas quem disse isso só estava tentando se libertar da própria loucura.
E diante disso só resta a contemplação, o silêncio.

Tanta coisa errada e não há quem se revolte
Tanta coisa escrita e não há quem elogie
Poeta bom é poeta morto: máxima cruel de todos tratados e teorias.
Queria não me importar, queria ser mais que isso...
Mas que culpa tenho se nasci humana?
Que culpa tenho se nasci magoável?
E diante disto só resta a contemplação, a lágrima.

Tantos ombros no ônibus e não há quem nos ajude
Tanta tristeza no trânsito e não tem quem te entenda!
Se ao menos houvesse bondes pra lembrar Drummond
Se ao menos houvesse flores pra lembrar Vandré
Se ao menos houvesse sonhos pra lembrar que vivo...
O que há são latas carregando coisas programadas para não pensar
Mas ainda assim sofrem, ainda assim votam.
E diante disto só resta a contemplação, a indiferença.

Às vezes a novela surpreende;
às vezes o gol é de bicicleta;
às vezes o ópio funciona;
E se tivermos muita sorte, um carro amarelo passa para quebrar o gelo da manhã;
Às vezes.
E diante disto só resta a contemplação, o bocejo.
(2010)